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PESQUISA SOBRE A REVOLTA DE CARRANCAS É DESTAQUE NA INTERNET


Famosa pelo ecoturismo, a antiga cidade de Carrancas, no Sul de Minas, guarda muitas histórias. Uma delas é a chamada Revolta de Carrancas, insurreição violenta de escravos, que aconteceu em três fazendas da família Junqueira, em 1833. 

O estudioso e especialista no assunto é o professor do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal de São João Del-Rei (UFSJ), Marcos Ferreira de Andrade, que há mais de duas décadas investiga o sangrento episódio, que teve repercussão na política nacional no período do Império, sendo considerada a maior revolta de escravos do Sudeste brasileiro. 

No último dia 13 de maio, o Arquivo Público Mineiro lançou o vídeo Um outro 13 de maio, no qual o pesquisador da UFSJ relata aspectos desse capítulo ainda pouco conhecido do público leigo. O vídeo, produzido pelo próprio Arquivo Público, já alcançou 11 mil visualizações e mais de 200 compartilhamentos, o que corresponde a 9.500 minutos de exibição.

A Revolta de Carrancas foi um confronto sangrento. Na tarde de 13 de maio de 1833, um grupo de escravos da abastada família Junqueira, armado de enxadas, foices e paus, iniciou uma ação pela liberdade de forma violenta na Fazenda Campo Alegre, matando o filho do proprietário, deputado Francisco Junqueira, que se encontrava no Rio de Janeiro quando a revolta começou. 

De lá, o grupo seguiu para a fazenda Bella Cruz, juntou-se aos demais escravos e atacou, de surpresa, a sede dessa outra propriedade, matando todos os moradores, num total de oito membros da família Junqueira. 

À noite, os revoltosos rumaram para a Fazenda Jardim, onde o levante foi sufocado e o líder do movimento, Ventura Mina, assassinado a tiros, juntamente com mais quatro escravos.

As lutas resultaram na morte de nove membros da poderosa família de latifundiários do Sul de Minas e de cinco escravos. Os revoltosos sobreviventes fugiram, sendo capturados dias depois. No processo penal, foram indiciados 31 escravos. Dos 17 condenados à pena máxima, 16 foram enforcados. 

A sentença foi executada em São João del-Rei, no bairro do Bonfim, uma vez que Carrancas na época era distrito de São João del-Rei. O episódio marcou a política do Governo Imperial e a relação das elites com a escravatura, resultando na origem de uma lei de exceção, aprovada em 1835, que punia com mais celeridade e exemplaridade a rebeldia escrava. Trata-se da maior condenação coletiva e efetivamente aplicada na história da escravidão brasileira.

Paixão e pesquisa
Na vida acadêmica do professor Marcos Andrade, a Revolta foi um marco definitivo. Ele se envolveu com o tema em 1992. Graduado em Filosofia dois anos antes, Marcos participou como bolsista num projeto dos professores da UFSJ, Maria Tereza Pereira Cardoso e Ivan de Andrade Vellasco, de catalogação de processos-crime do acervo do Museu Regional de São João del-Rei. 

“Foi numa das inúmeras caixas que encontramos o processo da Revolta. Pelo interesse que despertou em todos nós, Ivan e Teresa recomendaram que fizéssemos a transcrição, trabalhando pesado nas quase 300 páginas manuscritas do documento histórico”, explica. Dali, o pesquisador se apaixonou pela descoberta, continuou a pesquisar o tema, que foi discutido em sua dissertação de Mestrado em História pela UFMG, concluída em 1996.

“A Revolta de Carrancas foi um fato histórico que ficou esquecido por mais de 160 anos. Posso dizer que eu a batizei com esse nome, e que publiquei o primeiro artigo científico sobre esse episódio, na revista Afro-Ásia da Universidade Federal da Bahia”, relembra, com carinho. 

Depois de lecionar na UEMG, no campus de Campanha (MG), desenvolveu o projeto Memória Cultural do Sul de Minas, em parceria com a professora Tereza Cardoso e outros professores daquela instituição de ensino. A iniciativa resultou na criação de um centro de documentação na UEMG, com o mesmo nome.

Marcos cursou doutorado na UFF, onde pesquisou a formação das elites regionais e sua relação com o Estado Imperial. “Se no mestrado investiguei os escravos, no doutorado focalizei as elites, para dar conta da complexidade do processo histórico e analisar o outro lado da moeda. No último capítulo, fiz uma releitura da Revolta de Carrancas nesse contexto”, explica. 

A tese foi premiada pelo Arquivo Nacional em 2005, publicada pela mesma instituição em 2008, o que garantiu visibilidade nacional aos estudos sobre elites no Império e também para a Revolta de Carrancas.

Professor da UFSJ desde 2008, Marcos Andrade se dedica agora a pesquisar a memória oral da insurreição de Carrancas. “Depois de estudar a Revolta sob o aspecto oficial, documental, agora estou ouvindo histórias que ficaram na memória da comunidade.” 

Mas o pesquisador quer mais. “Estou desenvolvendo mais duas produções: um livro para explicar de forma simples ao público leigo o que foi essa Revolta, e um documentário sobre a memória oral dela”, adianta. Enquanto ressalta o papel da pesquisa científica e da universidade pública no Brasil, Marcos defende que “conhecer o passado é essencial, especialmente para as histórias silenciadas das lutas de negros pela liberdade, como ocorreu na Revolta de Carrancas.”

O vídeo pode ser acessado aqui. Para saber mais sobre a Revolta de Carrancas, acesse:


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