quinta-feira, 23 de junho de 2022

UFLA TEM 60% DE ESTUDANTES VINDOS DE ESCOLAS PÚBLICAS


A lei que instituiu as cotas de ingresso nas instituições federais de ensino superior para estudantes de escolas públicas completa, em 2022, dez anos em vigor. É um período após o qual o próprio texto da Lei 12.711 (conhecida como Lei de Cotas) recomenda sua revisão. Passado esse tempo, dados da Pró-Reitoria de Graduação (Prograd) da Universidade Federal de Lavras (UFLA) mostram que o programa vem alcançando seus objetivos e contribui para uma Universidade de público mais plural, com cotistas apresentando desempenho e índices de evasão semelhantes aos do grupo de ampla concorrência.

Uma série de vídeos produzidos pela Coordenadoria de Comunicação Social (CCS/UFLA), a serem veiculados de 20/6 a 24/6, traz a avaliação de estudantes e egressos que fizeram uso do ingresso por cotas. Eles relatam o quanto esse programa foi importante para que conseguissem estar no curso que sonhavam, na medida em que permitiu que competissem, para o ingresso, apenas com outros candidatos que enfrentaram as mesmas dificuldades do ensino básico público - pertencentes, portanto, a uma realidade semelhante. Falam também sobre como frequentar a Universidade proporcionou avanço em suas vidas, alguns deles sendo os primeiros da família a cursar o ensino superior. “A partir do momento em que você tem uma ação afirmativa, é como recebermos uma mensagem do tipo: aqui é um espaço para você estar também, você pode estar aqui. É exatamente isso que eu sinto”, disse o egresso Alysson dos Anjos Silva ao comentar o grupo de cotas que contempla pretos, pardos e indígenas. Ele se formou em Educação Física pela UFLA e foi cotista na instituição.

Até 2016, segundo a Lei de Cotas, as instituições deveriam garantir 50% das vagas para estudantes oriundos de escolas públicas. O aumento na oferta das vagas para cotistas nos processos seletivos da UFLA foi gradativo, como previsto na legislação: 12,5% em 2013; 25% em 2014; 37,5% em 2015, chegando à totalidade (50%) em 2016. Para o pró-reitor de Graduação da UFLA, professor Ronei Ximenes Martins, a Lei de Cotas surgiu para a reparação das diferenças entre os grupos sociais e é o reconhecimento de que a universidade precisa atender à população de forma igualitária. “Um país não pode evoluir com a desigualdade social imensa que é observada no Brasil. A Lei de Cotas auxilia no desenvolvimento do Brasil, porque recupera talentos que não teriam condições de contribuir para o desenvolvimento do País se não tivessem acesso ao ensino superior. Reserva de vagas não é privilégio, é correção de injustiças, e isso precisa continuar até que não tenhamos mais o abismo entre os que mais têm e os que menos têm”.

O reitor da UFLA, professor João Chrysostomo, também enfatiza a necessidade de manutenção da política de cotas. “Ela permite a quebra do ciclo de pobreza, uma vez que um dos critérios é a baixa condição socioeconômica dos cotistas e, ao longo do tempo, mitiga os efeitos do racismo estrutural existente no Brasil, corrigindo uma dívida histórica com a população negra. É uma grande ação afirmativa”, diz.

Ronei pondera que fazer uma avaliação dos efeitos da lei neste momento não é muito adequado, pois não há, ainda, dez anos de aplicação do percentual de 50%, completados apenas em 2016. Ainda assim, com dados de 2013 a 2021, a UFLA acompanha a evolução do programa e registra bons indicadores, segundo levantamento feito pela Prograd.

Ocupação das vagas
Ao longo de nove anos de vigência da lei, considerando dados de 2013 a 2021, a procura dos estudantes pela oportunidade de se formarem por meio das cotas foi uma realidade. A ocupação das vagas reservadas foi de 98,92%. Esse percentual significa que apenas 7 vagas, em 655 ofertadas para cotistas por semestre, não são ocupadas por esse grupo, e são então disponibilizadas para classificados na ampla concorrência (AC). Ao mesmo tempo, muitos cotistas ingressam pela ampla concorrência, quando têm nota de aprovação superior à nota de corte da AC. Em 2021, 32,8% dos ingressantes da AC vieram do ensino médio público. A UFLA saltou de 40% de ingressantes do ensino público em 2013 para os 63,33% em 2020. Atualmente, a Universidade conta com cerca de 60% do total de seus estudantes ativos oriundos da rede pública de educação básica.

O pró-reitor de Graduação destaca que, além do aumento percentual significativo na presença de ingressantes de escolas públicas, uma contribuição importante da Lei de Cotas foi o maior acesso desses estudantes a todos os cursos de graduação, inclusive aqueles de elevada concorrência, já que a reserva de 50% das vagas alcança todos os cursos. “Quando observamos a ocupação das vagas reservadas em cada curso, vemos que, em 8 dos 32 cursos ofertados pela UFLA, o ingresso de cotistas chega a ser superior ao de AC, com destaque para a Pedagogia (9,5% a mais de cotistas em relação a AC), Medicina (6,2% a mais) e ABI-Engenharia (4,8% a mais)”.

Desempenho dos cotistas e evasão

Se, para ingressar no ensino superior, os grupos de cotas, em sua maioria, apresentam notas de corte menores que o grupo de ampla concorrência*, ao longo de sua trajetória na UFLA esses estudantes alcançam desempenho equivalente aos demais. Quando observada a média do Coeficiente de Rendimento Acadêmico (CRA) dos cotistas entre 2013 e 2020, a diferença não supera três pontos de CRA médio geral em favor do grupo de AC. Em 2020, último ano da série de dados analisados, o CRA médio da AC foi 71,8581, e o registrado entre cotistas foi de 68,8071. Em alguns anos, os ingressantes por cotas obtiveram CRA médio maior que os da AC. Ao analisar os resultados em cada curso, as oscilações também ocorrem. Nos cursos de Medicina, Engenharia Física, Engenharia Agrícola, Matemática e Sistemas de Informação, o CRA dos ingressantes por cotas chega a superar o dos demais.

Entre os cotistas, o percentual daqueles que persistem no curso chega a ser maior do que entre os ingressantes por AC. A evasão no grupo de cotas é 2,2% menor do que no grupo de AC (24,9% contra 27,2%). Em 21 cursos de graduação, a evasão é menor entre cotistas, com as maiores diferenças em Educação Física Licenciatura (14,3% menor), Letras Licenciatura (9% menor), Administração (7,7% menor), Engenharia Ambiental e Sanitária (6,3%), Nutrição (5,9%), Filosofia (5,4%), Ciências Biológicas Licenciatura (4,9%) e Medicina (4,4%).

*No ingresso pelo SiSU em 2021/2, por exemplo, em 78% dos cursos a nota de corte da ampla concorrência foi superior à dos grupos de cotas.

A presença de pretos, pardos e indígenas (PPI)
Dentro dos 50% de vagas reservadas para egressos de escolas públicas, há oito grupos de cotas, específicos para a) candidatos de baixa renda, b) para os que possuem deficiência e para os c) autodeclarados pretos, pardos ou indígenas (PPI). Na perspectiva étnica, após a Lei de Cotas, entre 2013 e 2021, a UFLA registrou aumento de 10% no ingresso de pretos e pardos na graduação, segundo autodeclaração feita pelos estudantes no momento de ingresso. Esse aumento chegou a 15% em 2018, mas, com os trabalhos da Comissão de Heteroidentificação a partir de 2019, que busca validar a autodeclaração de pretos e pardos, mediante verificação das características fenotípicas dos candidatos, o percentual de aumento ficou entre 10% e 12%. No total, o ingresso de pretos e pardos, após a implantação da comissão, tem variado de 33% a 35%, percentual maior que a reserva de 25% das vagas previstas para esse grupo. Há, ainda, 21% de ingressantes que não fazem a autodeclaração, segundo dados de ingresso em 2021, o que sugere que a presença de pretos e pardos pode ter percentuais ainda maiores.

Quanto aos indígenas, desde 2018 não se observaram ingressantes.

Assistência estudantil: essencial para a permanência na Universidade
Segundo o coordenador do setor de Programas e Projetos da Pró-Reitoria de Assuntos Estudantis e Comunitários (Praec), Rossano Botelho, atualmente 70% dos estudantes contemplados pelo Programa Institucional de Bolsas (PIB/UFLA) ingressaram na graduação por cotas. Um estudo de mestrado realizado por ele mostra que os estudantes que passaram pelo PIB/UFLA têm menor evasão e melhor desempenho acadêmico, o que demonstra impacto potencial importante da assistência estudantil na permanência e rendimento dos estudantes.

“As cotas viabilizam o acesso, mas a assistência estudantil viabiliza a permanência”, resume a assistente social da Praec Paula Pereira de Alvarenga, ao falar sobre a relevância das políticas de suporte aos estudantes, especialmente quando o foco é público cotista, que coincide, em grande parte, com o público dessas políticas. Os cotistas e egressos que participam da série de vídeos em divulgação pela CCS também comentam o quanto as políticas de assistência estudantil - incluindo moradia, restaurante universitário, atendimentos de saúde e outras - foram e são imprescindíveis à sua formação.

Conheça os grupos de ingresso dos 50% de vagas destinadas a cotas

Grupo 1 - Candidatos autodeclarados pretos, pardos ou indígenas, com renda familiar bruta per capita igual ou inferior a 1.5 salário mínimo que tenham cursado integralmente o ensino médio em escolas públicas;

Grupo 2 – Candidatos com renda familiar bruta per capita igual ou inferior a 1.5 salário mínimo que tenham cursado integralmente o ensino médio em escolas públicas;

Grupo 3 - Candidatos autodeclarados pretos, pardos ou indígenas que, independentemente da renda (art. 14. II. Portaria Normativa nº 18/2012), tenham cursado integralmente o ensino médio em escolas públicas;

Grupo 4 - Candidatos que, independentemente da renda (art. 14. II. Portaria Normativa nº 18/2012), tenham cursado integralmente o ensino médio em escolas públicas;

Grupo 5 – Candidatos com deficiência autodeclarados pretos, pardos ou indígenas, com renda familiar bruta per capita igual ou inferior a 1.5 salário mínimo que tenham cursado integralmente o ensino médio em escolas públicas;

Grupo 6 – Candidatos com deficiência que tenham renda familiar bruta per capita igual ou inferior a 1.5 salário mínimo que tenham cursado integralmente o ensino médio em escolas públicas;

Grupo 7 – Candidatos com deficiência autodeclarados pretos, pardos ou indígenas que, independentemente da renda (art. 14. II. Portaria Normativa nº 18/2012), tenham cursado integralmente o ensino médio em escolas públicas.

Grupo 8 – Candidatos com deficiência que, independentemente da renda (art. 14. II. Portaria Normativa nº 18/2012), tenham cursado integralmente o ensino médio em escolas públicas.

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