Carlos Eduardo Calzavara, vice-diretor de Pesquisa e pesquisador do Centro de Pesquisas René Rachou da unidade da Fiocruz, em Belo Horizonte |
Com o início da primavera, tende-se a aumentar os casos de dengue, devido ao calor e a água acumulada pelas chuvas. Desde julho, a Dengvaxia, a primeira vacina contra a dengue disponível no país, desenvolvida pelo laboratório farmacêutico francês Sanofi Pasteur, já está nas clínicas privadas do Brasil.
Em abril de 2015, a Organização Mundial da Saúde certificou a vacina e recomendou seu uso para os países onde o vírus é endêmico.
Além disso, o Instituto Butantan, em São Paulo, tem desenvolvido a primeira vacina brasileira contra a dengue.
Para compreender melhor esse cenário, veja a entrevista com Carlos Eduardo Calzavara, vice-diretor de Pesquisa e pesquisador do Centro de Pesquisas René Rachou (CPqRR), da unidade da Fiocruz em Belo Horizonte, doutor em Bioquímica e Imunologia pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), e já coordenou diferentes projetos na área, com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (FAPEMIG).
Somente de janeiro a agosto de 2016 foram registrados 1.426.005 casos prováveis de dengue no país, segundo o Ministério da Saúde. Diante desse cenário, o que pode mudar com o surgimento das duas vacinas?
Ambas as vacinas, somadas às estratégias de controle vetorial inovadoras como o uso de mosquitos infectados pela bactéria Wolbachia e a busca por antivirais específicos, nos mostram quão desafiador mas também possível é o controle de uma doença infecciosa em um país de tamanha dimensão e diversidade genética e sociocultural. Vacinas contra a dengue são prometidas desde 2010 e, apesar da demora no desenvolvimento e aprovação de uma vacina segura, ambas são muito bem-vindas e tem grande potencial em minimizar nosso cenário endêmico.
O que diferencia a vacina que está sendo desenvolvida pelo Instituto Butantan da que já está disponível pelo laboratório Sanofi Pasteur?
Ambas são tetravalentes, ou seja, imunizam contra os quatro sorotipos do vírus da dengue. A Dengvaxia é uma vacina que usou a tecnologia do DNA recombinante para construir quimeras entre o vírus da febre amarela e os quatro sorotipos do Dengue vírus. É indicada apenas para pessoas entre 9 e 45 anos de idade. Requer três doses semestrais para proteção eficaz, o que significa que, no mínimo, um ano após a vacinação massiva é que começaremos a observar seu impacto no cenário epidemiológico do país. Mesmo sendo considerada tetravalente, a Dengvaxia não protege muito bem contra a infecção pelo sorotipo 2, fato que reduz sua capacidade protetora. Entretanto, pessoas vacinadas com a Dengvaxia tem menores chances de desenvolver a dengue grave. A vacina em teste pelo Instituto Butantan, desenvolvida em parceria com Institutos Nacionais de Saúde dos Estados Unidos, é tetravalente originada a partir de uma “mistura” de vacinas monovalentes testadas separadamente. Por isso, a vacina promete uma eficácia maior do que a observada pela Dengvaxia.
A vacinação é a melhor estratégia para diminuir os casos de dengue no país?
Uma estratégia de controle de uma endemia baseia-se em, ao menos, três eixos: prevenção, diagnóstico e tratamento. Nenhuma doença infecciosa é controlada exclusivamente com vacinação e nenhuma vacina é capaz de proteger completamente uma população. As opções de diagnóstico da dengue são atualmente satisfatórias. No entanto, não há tratamento específico contra a doença. Não existe, por exemplo, uma droga capaz de eliminar o vírus ou bloquear sua multiplicação, também não se sabe, de forma assertiva, o que leva um indivíduo infectado a desenvolver a forma mais grave da doença e outro indivíduo sequer apresentar qualquer sintoma. Enfim, a vacinação continua sendo nossa principal alternativa para diminuir a incidência da dengue.
Como o avanço no desenvolvimento das vacinas contribui para um novo panorama epidemiológico? Por que é preciso estar atento?
Deve-se enxergar as duas vacinas como complementares, mas não concorrentes. Vacinas precisam estar em constante evolução, adaptação (à população e/ou ao agente infeccioso) e aprendizado. As vacinas foram desenvolvidas com estratégias diferentes, e a vacina disponível atualmente mostrou boa eficácia na proteção contra a infecção pelo vírus da dengue, apesar de baixa capacidade de minimizar a infecção por um determinado sorotipo viral. Ou seja, é uma boa vacina, especialmente por sua capacidade de minimizar o desenvolvimento dos sintomas graves da doença, mas precisa evoluir. O advento da vacina do Instituto Butantan poderá preencher as deficiências da Dengvaxia e catalisar o desenvolvimento de uma terceira vacina ou estratégia vacinal mais eficiente.
Vacina disponível
O Laboratório Hermes Pardini, em Belo Horizonte, comercializa cada doce da vacina por 280,00 reais. A aplicação pode ser feita às terças e quintas-feiras, das 9h às 14h, e, aos sábados, das 7h às 12h, com agendamento prévio.
A vacina está disponível nas unidades Venda Nova, Pampulha, Belvedere, Buritis, Mangabeiras, Cidade Jardim e Aimoré.
por Roberta Nunes - da FAPEMIG
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