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TRABALHADORES DA SAÚDE COMETEM VIOLÊNCIAS SUTIS CONTRA USUÁRIOS DE DROGAS

Estudo da Medicina relaciona comportamento dos agentes aos estereótipos sobre os pacientes

Trabalhadores da saúde cometem violências sutis contra usuários de drogas em tratamento, concluiu estudo realizado pelo psicólogo Carlos Alberto Pereira Pinto. Ele avaliou a reprodução de estereótipos e de violência contra pacientes em tratamento do vício em álcool e drogas por parte de profissionais da saúde. 

A pesquisa foi baseada na experiência do psicólogo como gestor de um Centro de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas (CAPSAD), na Região Metropolitana de Belo Horizonte.

“Percebi essas atitudes que, na minha hipótese, eram violências sutis contra o usuário em tratamento. Eu me perguntava: isso é de fato uma violência?” conta. 

“A violência existe, apoiada no senso comum e nos estereótipos sobre o usuário. As práticas ditas assistenciais ainda são muito calcadas na moral, no medo, na procura de um grande ‘culpado’ para a situação. Essa associação de drogas e violência repercute no imaginário dos sujeitos, e o agente de saúde também leva isso para si”, afirma Carlos Alberto.

O estudo qualitativo, apresentado em forma de dissertação no Programa de Promoção de Saúde e Prevenção da Violência, foi desenvolvido com base em entrevistas com 12 trabalhadores de três unidades dos CAPSADs, em Contagem, Betim e no Barreiro.

Carlos revela que não foram todos os trabalhadores entrevistados que apresentaram discurso violento e preconceituoso, mas que todos eles afirmaram observar esse tipo de comportamento nos seus locais de trabalho.

Três categorias
O pesquisador classificou o comportamento dos trabalhadores da saúde em três categorias: julgamento moral, relação familiar e estereótipo do usuário como pessoa violenta.

“O uso de drogas é quase sempre pautado por um julgamento moral, e o usuário é entendido como um sujeito descomprometido, de caráter deturpado pela droga. É como se a droga fosse personificada ou um ‘demônio’ que se apossa da pessoa, o que a faz perder a capacidade de julgamento e avaliação de atitudes”, explica o pesquisador.

A categoria da relação familiar se desdobra em dois aspectos: de um lado, o usuário é aquele que desestabiliza toda a estrutura familiar; de outro, o núcleo familiar potencializa ou desencadeia o uso de drogas. “Os dois casos são extremos”, diz Carlos.

“Existe aquela ideia de que ‘o sujeito usa drogas porque tem a família desestruturada’. Mas o que é uma família desestruturada? E ter uma família desestruturada significa necessariamente entrar num vício?” questiona. “É tudo ou nada na tentativa de achar um culpado.”

Outro aspecto, de acordo com o pesquisador, está relacionado à “produção de um sujeito violento”. “Essa concepção é muito forte e foi historicamente construída. Constatei que a percepção dos trabalhadores da saúde ainda está muito próxima do senso comum sobre o usuário”, argumenta Carlos Alberto.

Desmitificar
O psicólogo aponta a necessidade de uma formação não técnica, visando desmitificar o imaginário acerca das drogas e do usuário. “Apesar da construção de uma política assistencial pautada no cuidado, ainda precisamos trabalhar na perspectiva do paciente. Precisamos criar espaços onde o trabalhador possa expor seus receios e pensamentos sobre o usuário, sem nenhum tipo de perseguição ou opressão, para que os estereótipos possam ser quebrados”, diz.

De acordo com ele, o trabalho aponta para a necessidade de investimento na formação do trabalhador. “Isso vai repercutir em melhor assistência para o usuário e a família. E, é claro, no cuidado com o trabalhador da saúde”, alega o pesquisador.

Carlos Alberto conclui que é importante reforçar e acreditar nas políticas de construção coletiva. “A reforma psiquiátrica e o trabalho em rede de atenção psicossocial é um esforço de mais de 30 anos, envolvendo profissionais, gestores, usuários. Infelizmente, temos visto um retrocesso”, enfatiza.

Dissertação: Análise das representações sociais dos trabalhadores da saúde mental dos Centros de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas (CAPSAD), acerca da assistência aos usuários atendidos nesses serviços
Autor: Carlos Alberto Pereira Pinto
Orientadora: Cristiane de Freitas Cunha
Coorientador: Renato Diniz Silveira
Defesa: maio de 2018, no Programa de Pós-graduação em Promoção da Saúde e Prevenção da Violência

com texto de Carol Prado e edição de Karla Scarmigliat - da assessoria da UFMG

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