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DEFENSORIA PÚBLICA RECOMENDA REVOGAÇÃO DE DISPOSITIVOS DE LEI MUNICIPAL DE IGARAPÉ


Para garantir a liberdade de ensino sobre diversidade nas escolas e assegurar a construção de um ambiente educacional que promova o pluralismo, o respeito, a formação cidadã e o combate a todas as formas de discriminação, a Defensoria Pública de Minas Gerais (DPMG) instaurou Procedimento Administrativo de Tutela Coletiva, buscando identificar leis ou atos normativos municipais que tenham estabelecido a proibição de abordagem, nas escolas, de questões relacionadas à diversidade, identidade de gênero e orientação sexual.

Ao tomar conhecimento da disseminação em municípios de Minas Gerais de leis dessa natureza, a DPMG, por meio de sua Coordenadoria Estratégica de Tutela Coletiva (CETUC) e de sua Coordenadoria Estratégica de Promoção e Defesa dos Direitos das Crianças e Adolescentes (CEDEDICA), buscou dialogar com os Poderes Executivo e Legislativo municipais a respeito da necessidade de adequação de suas normas aos princípios da dignidade e do pluralismo, previstos na Constituição Federal e replicados na Constituição Estadual.

Nesta quarta-feira, dia 28 de junho, data em que se celebrou o Orgulho LGBTQIAPN+, a CETUC emitiu recomendação, neste sentido, à Prefeitura e à Câmara Municipal de Igarapé, na Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH). O objeto da recomendação é a inconstitucionalidade da Lei Municipal 1.708/2015, que dispõe sobre a vedação da implantação da “ideologia de gênero” nos estabelecimentos de ensino do município.

Antecedendo a recomendação, no dia 10 de maio defensores públicos reuniram-se com os vereadores da cidade para esclarecer os fatores que indicam os vícios de inconstitucionalidade formal e material da Lei Municipal 1.708/2015. Ao fim da reunião, os representantes da Defensoria apontaram a necessidade de revogação da norma e a adequação de suas regras para a construção de uma política pública de educação fundada no respeito às diferenças e na pacificação do ambiente escolar.

Formalizando os termos debatidos na reunião, a recomendação sustenta, então, o vício de inconstitucionalidade formal da norma municipal, uma vez que suas regras ferem “a repartição de competências legislativas entre a União, o Estado e o Município (pacto federativo)”.

Isso porque, segundo o art. 30, I e II, da Constituição Federal, aos Municípios só é admitido legislar sobre assuntos de interesse local e em suplementação às normas federais e estaduais. A Lei Municipal 1.708/2015, então, cria regra de caráter proibitivo geral e descolado de realidade ou peculiaridade local. Além disso, a norma contraria as disposições da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei Federal n. 9.394/1996) e o Plano Estadual de Educação de Minas Gerais (Lei Estadual n. 23.197/2018).

Na recomendação, a DPMG elenca também os motivos que levam a Lei 1.708/2015 a ser contaminada por vícios de inconstitucionalidade material, haja vista que caminha em sentido contrário ao “dever estatal de combate à discriminação e de promoção da dignidade da pessoa humana, além de descumprir as obrigações de se construir ambiente escolar acolhedor, fundado na pluralidade e na cultura da paz e do respeito ao outro”.

Conforme o documento, “para além da oferta de serviços de educação, os Municípios devem promover ações para garantir a permanência e a frequência dos estudantes nas escolas, adotando medidas de inclusão”. Por isso, defende-se que é obrigação estatal combater a evasão, especialmente quanto a estudantes vulneráveis e alvos de discriminação.

Assim, continua a recomendação, “aqueles estudantes que porventura se identifiquem com os temas reprimidos podem ser expostos a violências e à prática de bullying, de forma desimpedida. E diante da proibição legal, não encontrarão proteção do corpo discente, nem o apoio necessário ou o preparo pedagógico de profissionais para que abordem tais questões, de modo a combater a discriminação, promovendo ambiente de tolerância, respeito às diferenças e, afinal, pacificação na escola”.

Oposição ao pluralismo
Segundo a recomendação, a Lei Municipal 1.708/2015, de Igarapé, impõe obstáculos à liberdade de aprender, ensinar e divulgar o pensamento, bem como expressa oposição ao pluralismo de ideias, reputados pelo art. 196, incisos II e III, da Constituição Estadual (CEMG), como princípios fundantes do ensino. Além disso, a norma configura censura e constrição à liberdade de cátedra, contrariando o art. 277 da Constituição Federal.

O documento elenca decisões do Supremo Tribunal Federal que vêm buscando reparar normas, posturas estatais e construções culturais e sociais que, ao longo de toda a história, impuseram hostilidade e subalternidade em prejuízo às pessoas LGBTQIA+. Registra, também, tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário e que asseguram a abordagem de questões relacionadas a gênero, sexualidade e assuntos correlatos nas escolas.

Dessa forma, a Defensoria Pública de Minas recomendou que o Município de Igarapé, por meio de seus Poderes Legislativo e Executivo, exerça o autocontrole de constitucionalidade, adotando as medidas necessárias à revogação dos dispositivos contidos na Lei Municipal n. 1.708/2015, extinguindo quaisquer regras que proíbam o debate sobre a diversidade, identidade de gênero e orientação sexual nas escolas.

O documento recomenda ainda que seja estabelecida uma nova política pública de educação que assegure a promoção da cidadania, a pluralidade, o respeito às diferenças e a erradicação de todas as formas de discriminação nas escolas, inclusive quanto às questões de diversidade, identidade de gênero e orientação sexual.

Por fim, orienta que a recomendação seja publicada na íntegra nos sites da Prefeitura e da Câmara Municipal para permitir o amplo acesso à população e a conscientização das cidadãs e cidadãos.

Emitida em 28 de junho de 2023, a recomendação fixa o prazo de 20 dias para resposta, com remessa à DPMG de eventuais Projetos de Lei que tenham sido protocolados ou que estejam em tramitação na Câmara de Vereadores, no sentido de promover a revogação das normas proibitivas contidas na Lei Municipal nº 1.708/2015, além da apresentação de cronograma para as atuações programadas sobre o tema.

Assina o documento o defensor público Paulo Cesar Azevedo de Almeida, à frente da Coordenadoria Estratégica de Tutela Coletiva (CETUC), da DPMG.

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