quarta-feira, 3 de dezembro de 2014

OS GARGALOS DA MEDICINA

Inicialmente, os estudantes de medicina utilizarão prédios já existentes na universidade
Ostentando um alto custo de vida, com a economia estagnada e uma população próxima de atingir os 100 mil habitantes, Lavras, cidade localizada na região do Sul de Minas, vive o clima de retomada da especulação imobiliária. Após um período de estabilização do mercado de imóveis, o anúncio da implantação do curso de medicina na Universidade Federal de Lavras (Ufla), com início a partir de março de 2015, atiçou ainda mais a sanha do mercado.

Em Lavras, no auge do sucesso imobiliário, espraiados em direção aos extremos, condomínios horizontais apelavam para o contato com a natureza. Novos programas habitacionais - e também a falta deles - empurraram a população para periferias, ocupando e desenvolvendo regiões mais afastadas e antes isolados de habitações. 

Agora, uma região populosa e estrangulada pelas mesmas habitações e por um trânsito já intenso, virou alvo de interesse em virtude da aquisição pela Universidade Federal de Lavras do prédio do antigo Hospital do Coração, na rua Coronel Juventino Dias, no bairro Jardim Glória, Zona Oeste da cidade. A compra orçada em mais de R$3 milhões, tem como finalidade servir para implantação do Hospital Universitário (HU), que vai amparar o curso de medicina da instituição.

Segundo especialistas do mercado imobiliário, a valorização dos imóveis no Jardim Glória já atinge 60%. Na avenida Evaristo Gomes Guerra, que é a continuação da Coronel Juventino Dias, alguns terrenos já chegam a custar em torno de R$250 mil. Apesar da construção do hospital movimentar a economia, com a geração de empregos e abertura de novos negócios, ela também trará muitos impactos para aquela região. 

A principal via, ao qual está localizado o prédio adquirido, é utilizada como caminho para quem sai da Zona Norte e até da Zona Leste com destino a saída da cidade e aos bairros da Zona Oeste, sem precisar cortar a região central. As vias da região já possuem um tráfego intenso e com as obras, a situação ficará mais preocupante ainda. 

Desafios da medicina
A Universidade Federal de Lavras tem longos desafios pelos próximos 4 anos. Com centenária trajetória reconhecida na área de Ciências Agrárias, a instituição dá um giro de 360 graus com a implantação do curso. Inicialmente, os estudantes de medicina utilizarão prédios já existentes na universidade. Conforme reportagem do Blog O Corvo-Veloz veiculada na última quinta-feira, 27, segundo fontes ligadas ao alto escalão da Ufla, os prédios do Departamento de Medicina Veterinária (DMV) deverão ser os mais usados pelos estudantes da medicina. 

Adriano José Pereira, que inicialmente ficou lotado no DMV, é o primeiro professor contratado e tomou posse no dia 13 de agosto deste ano. O Conselho Universitário (Cuni) da Universidade Federal de Lavras já oficializou a criação do Departamento de Ciências da Saúde (DSA), para amparar os professores que serão contratados. 

O chefe do DSA é o professor Luciano José Pereira. Ele pertence ao quadro docente do Departamento de Medicina Veterinária e possui graduação em Odontologia pelo Centro Universitário de Lavras (Unilavras) e é o presidente da Comissão de Implantação do curso. Também é do mesmo departamento, a coordenadora do curso de medicina da Ufla, professora Joziana Muniz de Paiva Barçante. Ela é graduada bióloga pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF).

Divisão de espaços já existentes
Uma área está sendo construída, mas a previsão é de que ela fique pronta somente nos próximos 2 anos e até lá, a divisão de espaços é a solução encontrada, já que o curso começa em 2015 e a primeira turma deve concluir o bacharelado no curso em 2020. O curso contará com o mínimo de 12 períodos e o máximo de 18. A carga horária de disciplinas obrigatórias é de no mínimo 7.616 horas.

O hospital também é uma obra que vai demandar tempo e dinheiro. Estima-se que possa levar até 3 anos para ser concluído e demanda recursos da ordem de R$70 milhões. Até lá, os estudantes terão que atuar na prática na rede municipal de Saúde de Lavras e na Santa Casa de Nepomuceno, cidade distante em torno de 32km. 

Administração do hospital
Após a conclusão do Hospital Escola, o gestor da universidade terá que tomar uma fatídica decisão. Manter a administração do empreendimento hospitalar nas mãos da instituição ou entregá-lo a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh), estatal vinculada ao Ministério da Educação (MEC). Cerca de 20 mil postos de trabalho em hospitais universitários brasileiros deixarão de ser contratados por meio de concurso público com a terceirização das atividades desempenhadas nas unidades a partir da instalação da Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh). 

O alerta é feito pelo Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (Andes-SN). O Andes alerta para problemas como a perda da autonomia universitária e seu impacto direto no ensino, pesquisa e extensão diante do novo cenário da transferência de gestão dos hospitais universitários federais.

Com a contratação da Ebserh estarão totalmente extintos os concursos públicos para o hospital. A empresa tem liberdade de contratar pessoal, em contratos do tipo CLT, com 2 anos de duração, renováveis por no máximo mais 2. Isso levará a perda de estabilidade, aumento da rotatividade, flexibilização das relações trabalhistas e redução a liberdade de organização e reivindicação dos trabalhadores. Outro ponto problemático é que os servidores concursados poderão ser cedidos a empresa, porem o ônus continuará sendo da universidade. 

Em contrapartida, a manutenção dos hospitais universitário federais sob a administração das instituições representam um peso no orçamento das instituições. Segundo dados do Ministério da Educação (MEC), apenas os HUs federais acumulam por ano um déficit total de 30 milhões entre o que é produzido e o que é pago, problema que se origina nos valores defasados da tabela Sistema Único de Saúde (SUS), levando a uma dívida acumulada de 425 milhões de reais, mais do que todo recurso do Banco Mundial para o Programa Nacional de Reestruturação dos Hospitais Universitários Federais( REHUF).

Documento publicado pela Organização Mundial de Saúde (OMS) estiman que os HUs são 12% mais caros do que hospitais não-universitários de alta tecnologia. Isso se explica pelo fato de além dos serviços assistenciais eles também desenvolvem ensino e pesquisa. 

A Portaria Interministerial nº 1.000 de 15 de abril de 2004, é a primeira que abriu caminho para a extinção dos HUs, conforme existem hoje. Essa portaria passou a unificar hospitais universitários (vinculados e geridos por universidades), hospitais escola (vinculados e geridos por escolas médicas isoladas) e hospitais auxiliares de ensino (hospitais gerais que desenvolvem atividades de treinamento em serviço, curso de graduação ou pós-graduação através de convênio com instituição do ensino superior) sob a mesma denominação: hospitais de ensino. 

Sua regulação e as requisições para sua certificação também passaram a ser iguais. A medida rebaixou o estatuto dos hospitais universitários, que na sua relação orgânica com as universidades reconhecidamente sempre garantiram melhores condições de formação com indissociabilidade entre pesquisa, ensino e extensão. 

Gastos e dependência política
Segundo o Portal Terra, o anúncio feito pela presidente Dilma Rousseff (PT), em junho do ano passado, da criação de 11 mil vagas em medicina como forma de levar profissionais para o interior do País, aconteceu no momento em que coordenadores de pelo menos 11 cursos de medicina de universidades federais se mobilizavam contra a falta de apoio do Ministério da Educação (MEC) para garantir a qualidade da formação de novos médicos.

De acordo com a reportagem, Criados em sua maioria nos últimos 10 anos, esses cursos fazem parte da proposta do governo de interiorizar o ensino da medicina, garantindo que os médicos recém-formados permaneçam nas comunidades onde há falta de profissionais. No entanto, sem contar com hospital universitário, essas instituições dependem de arranjos políticos para permitir que os alunos façam as aulas práticas nos hospitais da rede local. 

Além disso, os coordenadores dizem que a falta de professores e de preceptores (médicos responsáveis por acompanhar os alunos durante as aulas práticas nas unidades de saúde), somados à estrutura precária, inviabilizam a continuidade do trabalho.

Fique por dentro do assunto: Scolforo anuncia curso de Medicina na Ufla












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